sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Vingança

Eram 6h15min quando seu ônibus parou no ponto. Como de costume, estava cheio. Ela colocou a bolsa à frente do corpo e foi se espremendo para passar pela roleta. Encontrou um lugar e tentou se segurar ao tempo que o motorista arrastava. Sabia que seriam mais duas horas até chegar ao seu destino. Lá na frente, um homem citava trechos da bíblia. Ao parar no ponto, entrou um ambulante vendendo canetas. Já estava cansada mesmo antes de começar a trabalhar. A dura rotina castigava seu físico e sua mente. Desejou estar em casa, deitada em sua cama, enrolada nos lençóis. Mas não tinha o que fazer e afastou esse pensamento. O ônibus parou em outro ponto e mais pessoas entraram. Uma criança vomitou no banco de trás e o cheiro, misturado com o calor, era cada vez mais insuportável. Uma mulher entrou e se alojou ao seu lado. Tentando marcar território, enterrou o cotovelo em suas costelas. Olhou feio, mas como não queria briga àquela hora da manhã, não disse nada. A mulher, como se notasse a sua irritação, empurrava-a cada vez mais para o lado. Mudou de lugar e, ao se instalar no novo canto, vagou um lugar bem à sua frente. Encarou a mulher que a empurrara e sentou-se. Estava vingada.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Tangerina

Havia saído de casa para comprar pão quando a viu. Ela estava parada numa banca que vende frutas. Procurava por tangerina. Ela havia sonhado com tangerina e passou o dia todo com vontade de comer. Como não tinha, saiu andando, chateada por não ter seu desejo realizado. Ele saiu atrás dela e disse q estava feliz em vê-la. Fazia mais de um ano desde a última vez que se viram. Ela sorriu. Disse que era sempre bom vê-lo e que era uma pena estarem tão distantes. Puxou-a pelo braço para perto de si e deu-lhe um cheiro longo em seu pescoço. Não queria mais sair dali. Arrepiou-se com os pelos da sua barba. Afastou-se por um momento e tornou a abraçá-lo. Ela também não queria mais sair dali.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Cansado

Fechou a porta do quarto e deitou na cama. Aquela mensagem o deixara chateado. Havia errado e tinha consciência disso. Mas estava cansado. Cansado de a todo momento ter que provar que a amava. Cansado de ser 100%, de nunca poder errar, com receio de ser mal interpretado. Cansado das brigas ao telefone. Cansado de si mesmo. Pensou em desistir. Uma ligação e teria resolvido tudo. Seria mais fácil ficar só do que ter que reconquistar a confiança. Mas o sentimento era mais forte. Não queria e não conseguiria ficar sem ela. Se combinavam, apesar de diferentes. Sentiria falta dos charminhos, das tardes na cama, das brigas de almofadas, da demora em sair porque ela tinha que falar, e beijar, os cachorros da casa e de como ela se aninhava no seu peito e não deixava espaço para ele em sua própria cama. Sentiria falta do que era bom e do que era ruim também. Desistiu de desistir. A amava muito e por isso encontrou forças para continuar.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Táxi

Estava sentado na varanda de casa. Numa mão, uma caneca de café e na outra um cigarro. Lembrava daquela moça que havia conhecido anos atrás e que nunca voltou a ver. Havia passado bastante tempo e muitas coisas e pessoas passaram por sua vida, mas nunca conseguiu esquece-la de verdade. Depois de tanto tempo, passou a pensar nela todos os dias. Tinha os seus contatos, mas nunca se atreveu a ligar ou a mandar um e-mail. Tinha medo de ela nao lembrar dele e daquele breve momento que passaram juntos. Lembrou da sua boca gelada na despedida e do sorriso de menina. Como ela estaria agora? Bonita, com certeza. Mulheres como ela sempre venciam o tempo. Ao contrário dele. Havia envelhecido. Envelheceu e esqueceu de viver. Esqueceu ou talvez não tivesse coragem para isso. Sera que ela o esperou? Por quanto tempo teria sido isso? Prometeu voltar, jogar tudo para cima, mas nunca o fez. Acendeu outro cigarro. Pegou o celular e olhou por alguns instantes a foto dela nos seus contatos. Escreveu um texto rápido e enviou: "Eu nunca deveria ter deixado vc entrar naquele táxi".

Mais um mês

O dia havia amanhecido cinza, mas por um motivo, para ele, não havia a menor importância. Havia acordado cedo para trabalhar, já pensando na volta. Recebeu uma mensagem dela desejando bom dia e felicitando pela data especial. Sorriu para si mesmo, desejando que as horas passassem. Durante todo o tempo, trocaram mensagens e no final do dia, saiu para vê-la. No caminho houve um acidente, a rua alagou, todos os sinais estavam fechados e o que era para ser minutos, se tornaram horas. Qdo finalmente chegou, ela já estava dormindo. Mas não importava. Deu-lhe um beijo no rosto, disse que a amava e adormeceu ao seu lado, feliz por estarem mais um mês juntos.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

O que é o fim?

Aquela mensagem recebida já era o prenuncio do que estava por vir. Passou três dias angustiado, sem saber realmente o que iria acontecer. No horário marcado, saiu de casa preparado para o pior. Sabia que tudo que começa, um dia tem que acabar. Mas as vezes não nos preparamos para o fim. Afinal, o que é o fim? Conclusão, morte, objetivo a ser alcançado... Sabia o significado da palavra, mas não entendia como e por que esse fim acontecia. No caminho se perguntava o tempo todo se não haveria alguma alternativa, mas não conseguia enxergar nada além do óbvio. Havia acabado. Tantos anos, tanta luta por aquilo que acreditava para chegar ao momento derradeiro. Ao chegar, viu os semblantes sérios daqueles que faziam parte da sua vida. Alguns com lágrimas nos olhos, outros de cabeça baixa. Percebeu que seus temores não eram sem sentido. Que aquilo era real. Sentiu o clima tenso e resolveu não se pronunciar. Estava feito. Não havia como voltar daquela situação. Só lhe restou calar-se e terminar de ouvir o que diziam. Ao terminar, levantou, abraçou algumas pessoas, tentou dizer algo que animasse os mais tristes, mas era inútil. Nem ele acreditava no que estava dizendo. Foi tomado por uma tristeza aguda. Vagou pelas salas vazias. Despediu-se do seu palco. Despediu-se de onde se sentia em casa. Do café quentinho, dos sorrisos, das brincadeiras, até mesmo das chateações. Tudo fez parte do seu crescimento. Chorou um pouco sozinho. Não queria que as pessoas vissem. Os abraços, as trocas de telefone, a despedida. Não tinha estômago para isso. Esvaziou seu armário. Guardou tudo cuidadosamente. Ao sair, olhou pela última vez aquele lugar que lhe serviu de escola. Pois sabia que havia aprendido muito mais do que ensinado. Aprendeu a ser pai, irmão, filho, professor. O que faria agora, não saberia dizer. Mas como o fim é apenas uma passagem, tinha certeza que uma hora encontraria seu caminho.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Vizinhos de porta

Acordou assustado com a campainha do seu apartamento tocando insistentemente. Pulou da cama, viu que o relógio marcava 6h30min e foi até a sala para ver que seria naquela hora de sábado. Ao abrir, deparou-se com sua vizinha de porta, vestido pijama e usando pantufas nos pés. – Posso me deitar com você? – Pediu ela. Abriu passagem e ela correu para o seu quarto e deitou em sua cama. Ele a acompanhou e deitou ao seu lado. – Preciso de um abraço. Acordei precisando me sentir em segurança. Ele abraçou-a e dormiram assim pelo resto da manhã.